Aaron Swartz: Programação Orientada a Ideais

Aaron Swartz: Programação Orientada a Ideais

Por Mateus Pedro Bonamigo (UTFPR)

Revisão: Alane Marie de Lima, Heloise Acco Tives, Sílvia Amélia Bim
Edição: Alane Marie de Lima

Esse texto foi produzido no contexto da disciplina optativa Computação e Sociedade ofertada para estudantes de Sistemas de Informação e Engenharia de Computação da Universidade Tecnológica Federal do Paraná – campus Curitiba. A disciplina foi conduzida de forma online de junho a agosto de 2021.

O conteúdo aqui apresentado pode ser sensível para algumas pessoas. O texto foi escrito como parte da campanha Setembro Amarelo, de prevenção ao suicídio, criada pelo Centro de Valorização a Vida (CVV) em 2015.

Fonte: The Guardian / Michael Francis

Aaron Hillel Swartz foi um programador e ativista nascido em 1986 numa cidade próxima a Chicago (EUA). Aaron era o filho mais velho de uma família de origem judaica. Seu pai havia fundado, em 1977, a empresa de softwares para computadores IBM (International Business Machines Corporation), o que propiciou para Aaron o acesso a computadores e ao desenvolvimento de software muito cedo em sua vida. Segundo relatos de seus irmãos, Aaron era uma criança extremamente curiosa, e que aprendia as coisas rapidamente. Aprendeu a ler de forma autodidata aos 3 anos de idade, e desenvolveu um jogo de perguntas e respostas sobre Star Wars, com seu irmão Ben Swartz, quando ambos ainda eram crianças [1].

Da esquerda para a direita, Ben Swartz, Robert Swartz e Noah Swartz na premiére do filme sobre Aaron Swartz no festival de Sundance, em 2014. Imagem (GettyImages/Robin Marchant)

Este envolvimento com computador e internet deixou Aaron desinteressado com a escola, visto que, segundo ele, tudo o que um professor poderia ensinar ele conseguiria encontrar, ou na internet, ou em um livro. Com esta mentalidade, aos 12 anos de idade desenvolveu o site The Info Network, uma enciclopédia online colaborativa, onde qualquer pessoa poderia incluir e editar informações. Anos mais tarde, a Wikipedia foi criada com a mesma premissa do site desenvolvido por Aaron [1].

Print da The Info Network (Fonte: O Arquivo)

Após o desenvolvimento da The Info Network, Aaron passou a ser parte ativa da comunidade online. Aos 13 anos, ele fez parte do grupo que desenvolveu o protocolo RSS (Really Simple Syndication). Este protocolo é usado para “catalogar” informações de acordo com seus conteúdos, e continua sendo utilizado até os dias de hoje [1].

Ainda durante sua adolescência, Aaron se interessou pelo assunto que definiria sua vida, direito autoral, especialmente porque no início dos anos 2000 os EUA estavam num grande debate sobre o assunto devido ao Napster, uma plataforma de distribuição de músicas online. Todo este interesse por direitos autorais fez com que Aaron fizesse parte do grupo que concebeu a licença “Creative Commons (CS)”, que permite o uso de materiais criados por outras pessoas, diferentemente de outras licenças existentes até então, que restringiam o uso do conteúdo ao criador, ou a pessoas licenciadas. Aaron foi responsável por criar uma plataforma online para a CS, facilitando seu entendimento e uso pelas outras pessoas. No lançamento da “Creative Commons”, em 2002, Aaron tinha 16 anos [1].

Aaron vai para a Universidade de Stanford em 2004, e entra num grupo especial de formação de pessoas promissoras, ou seja, pessoas que em poucos anos se tornariam grandes personalidades da sua área. Entretanto, após um ano, Aaron sai da faculdade por não se adequar ao ambiente, e começa a trabalhar para uma startup. Após alguns projetos nesta startup, Aaron ajuda no desenvolvimento do Reddit, mídia social e site agregador de notícias, e faz parte da venda deste site também. Com a venda do Reddit, Swartz se muda para São Francisco (EUA) e descobre que o modo de vida e de trabalho no Vale do Silício (região do estado da Califórnia que concentra diversas empresas de alta tecnologia) não funcionavam com a sua personalidade, tanto que forçou sua demissão dias após sua ida para lá. Aaron sabia que sua motivação não era o dinheiro, mas sim o propósito do que estava fazendo. Foi neste momento que ele abriu mão do mundo das startups, que facilmente o fariam multimilionário (ou até bilionário) para ingressar com mais afinco no mundo do ativismo.

Aaron acreditava que o conhecimento deveria ser universal, ou seja, todos deveriam ter acesso ao conhecimento e à informação, e para isso, as pessoas já teriam a perfeita ferramenta: a internet. Ele cria diversas iniciativas que ajudam a população a ter acesso à informação, como o Watchdog.net, que facilitava ao público o acesso às informações dos políticos em quem votaram, e a Open Library, uma enciclopédia com informações sobre livros, resenhas, informações editoriais, entre outros [1].

Em todos estes anos de luta para garantir acesso à informação, Aaron enfrentou o governo estadunidense diversas vezes. A campanha contra o SOPA (Stop Online Piracy Act, traduzido livremente como ‘pare com a pirataria online) foi um dos casos que tornaram Aaron conhecido pelo público em geral. O SOPA serviria para evitar a pirataria online, mas na verdade dava o direito de empresas detentoras de propriedades intelectuais processarem e até derrubarem sites inteiros, alegando infração de direitos autorais. A repercussão das ações de Aaron foram tão grandes que, em poucos dias, a votação foi revertida, fazendo com que a maioria do congresso se colocasse contra tal ato.

Apesar destas lutas, o que Aaron realmente queria era garantir o acesso de informações públicas ao público em geral. Em 2008, Aaron baixou 2.7 milhões de documentos federais, de domínio público, para que pudessem ser de acesso público e gratuito, visto que estes documentos estavam dentro do PACER, um serviço de acesso a documentos públicos que cobrava por seus serviços (ou seja,  não era um serviço tão público assim). Apesar das acusações feitas (muitas delas falsas), e após investigações pelo FBI, Aaron não foi julgado neste caso, mas os documentos baixados nunca foram liberados [3]. Apesar disso, após estas ações, novas iniciativas foram criadas, tornando o sistema PACER um pouco mais “público” do que era anteriormente [4].

O caso que definiu a vida de Aaron aconteceu em 2010, quando ele entrou em uma parte restrita do campus do Massachussets Institute of Technology (MIT), e baixou milhares de artigos da JSTOR, um repositório de artigos na qual o pagamento de uma assinatura ou autenticação dentro de uma instituição permite acesso a plataforma [4]. Neste caso, Aaron usou sua conexão do MIT para baixar tais documentos. Swartz foi preso pela polícia do Campus do MIT, pouco tempo depois do ocorrido, após ter sido acusado de invadir a parte restrita do campus para cometer delitos.

Logo após tal fato, Aaron também foi acusado de cometer diversos crimes em esferas nacionais e estaduais, incluindo fraude eletrônica e roubo de propriedade privada. Para evitar problemas na investigação de âmbito nacional, as acusações de esferas menores foram retiradas, ou seja, Aaron não era mais julgado pelas acusações iniciais, mas era perseguido pelo governo estadunidense, que o enquadrou na “Computer Fraud and Abuse Act”, uma lei criada em 1986. Apesar das políticas de acesso do MIT não proibirem o acesso e download dos arquivos, e Aaron ter acesso à rede da instituição e ao JSTOR, Aaron foi indiciado por 13 crimes federais, resultando em uma multa milionária, e a 50 anos de prisão [5]. Tal pena fora tão severa pois havia interesse de que Aaron se tornasse um exemplo, para que outros não tentassem fazer o mesmo. Algumas tentativas de negociação foram feitas, mas Aaron negou todas elas, visto que ele não via motivo para tal perseguição. 

Em 2013, Aaron Swartz se suicidou em seu apartamento, no Brooklyn (New York, USA), após uma longa luta contra a depressão. Após sua morte, todas as acusações foram retiradas, e o caso se deu por encerrado [2].

Muito se discute sobre o papel de cada instituição na morte de Aaron, visto que o MIT foi quem deu o pontapé inicial nesta perseguição [3]. Alguns relatos apontam uma possível pressão do governo sobre a diretoria da instituição para que o ativista fosse acusado, mas isto não é o principal, isto não define este personagem. Ele foi um programador genial, que poderia facilmente estar ao lado de outros grandes desenvolvedores que se voltaram para o lucro, mas ao invés disso sempre usou sua capacidade e ferramentas que desenvolveu para apoiar suas crenças e alavancar suas ideias.


Referências:

[1] THE INTERNET’S Own Boy: The Story of Aaron Swartz. Direção: Brian Knappenberger. Roteiro: Brian Knappenberger. [S. l.: s. n.], 2014. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=9vz06QO3UkQ&t=774s. Acesso em: 17 jul. 2021.

[2] DAY, Elizabeth. Aaron Swartz: hacker, genius… martyr?. The Guardian, [S. l.], p. 1, 2 jun. 2013. Disponível em: https://www.theguardian.com/technology/2013/jun/02/aaron-swartz-hacker-genius-martyr-girlfriend-interview. Acesso em: 17 jul. 2021.

[3] GREENWALD, Glenn. The inspiring heroism of Aaron Swartz. The Guardian, [S. l.], p. 1, 12 jan. 2013. Disponível em: https://www.theguardian.com/commentisfree/2013/jan/12/aaron-swartz-heroism-suicide1. Acesso em: 17 jul. 2021.

[4] WEI , Patricia. Remembering Aaron Swartz’s legacy in light of JSTOR opening access.[S. l.], 27 mar. 2020. Disponível em: https://www.stanforddaily.com/2020/03/27/remembering-aaron-swartzs-legacy-in-light-of-jstor-opening-access/. Acesso em: 9 set. 2021.

[5] HSIEH, STEVEN. Why Did the Justice System Target Aaron Swartz?. [S. l.], 23 jan. 2013. Disponível em: https://www.rollingstone.com/politics/politics-news/why-did-the-justice-system-target-aaron-swartz-106848/. Acesso em: 9 set. 2021.

Outras fontes para referência:

AMSDEN , DAVID. The Brilliant Life and Tragic Death of Aaron Swartz. Rolling Stone, [S. l.], p. 1, 15 fev. 2013. Disponível em: https://www.rollingstone.com/culture/culture-news/the-brilliant-life-and-tragic-death-of-aaron-swartz-177191/. Acesso em: 17 jul. 2021.


Sobre o autor: 

Mateus Pedro Bonamigo

Graduando em Bacharelado de Sistemas de Informação na Universidade Tecnológica Federal do Paraná(UTFPR). Desenvolvedor de jogos há 6 anos, e interessado em software livre.

 

 


Como citar este artigo

BONAMIGO, Mateus P. Aaron Swartz: Programação Orientada a Ideais. SBC Horizontes, setembro. 2021. ISSN 2175-9235. Disponível em: <http://horizontes.sbc.org.br/index.php/2021/09/aaron-swartz-programacao-orientada-a-ideais/>. Acesso em: DD mês. AAAA.

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