Afghan Dreamers – Como é a realidade das meninas afegãs na computação
Por Mariana Carmin
Que a realidade das meninas no Afeganistão é diferente da realidade observada por nós meninas e mulheres residentes no Brasil nós já sabemos, mas como é a realidade das meninas que optam por seguir uma carreira na área de tecnologia no país? O grupo Afghan Dreamers é um dos grandes exemplos de meninas afegãs na área de computação. Esta matéria reúne algumas informações e reflexões acerca da vivência destas meninas em seu país.
Roya Mahboob, mentora do grupo, é uma empresária afegã, que se tornou uma das primeiras mulheres a empreender neste ramo em seu país. É fundadora e CEO da Citadel Software Company (ACSC), Roya fundou a ACSC com a intenção de criar mais oportunidades de emprego para as recém formadas em cursos da área de tecnologia. Além disso, é presidente da Digital Citizen Fund, uma organização sem fins lucrativos que pretende diminuir a desigualdade existente entre países desenvolvidos e subdesenvolvidos. Com a Digital Citizen foram criadas salas de aula para que as meninas aprendessem sobre tecnologia da informação, levando a oportunidade do conhecimento na área tecnológica para milhares de meninas no Afeganistão [1].
A inspiração dos trabalhos de Roya vem da realidade de seu país. Roya afirma que as meninas afegãs são educadas para cuidarem da casa, e que a quarta revolução industrial, tão discutida e abordada no Ocidente, está longe da realidade dessas meninas.
A realidade retratada por Roya é assustadora:
“Unfortunately, the Internet is accessible to only half the world.”
“Infelizmente, a Internet é acessível apenas para metade do mundo.” (MAHBOOB, 2020, p. 21, tradução nossa).
A falta de acesso a Internet acarreta uma escassez tecnológica e de informação. A situação é agravada para as mulheres e pessoas mais pobres, que muitas vezes vivem em uma escuridão tecnológica completa [2]. Roya, percebendo esta realidade e o número reduzido de mulheres na área de tecnologia, decidiu que dedicaria seu trabalho para construir um ambiente amigável para mulheres na área de tecnologia [2]. Segundo Roya, a discriminação e falta de acesso acabam por vezes quase negando o lugar de direito dessas pessoas na área de tecnologia [2].
Mesmo com todas as dificuldades enfrentadas em seu país, Roya é mentora da brilhante equipe de robótica “Afghan Girls Robotics Team – Afghan Dreamers”, composta por meninas entre 15 e 19 anos [4]. A equipe ganhou notoriedade ao desenvolver um ventilador capaz de auxiliar no tratamento da COVID-19. O desenvolvimento do ventilador foi um grande desafio para a equipe:
“We used locally available second-hand car spare parts to assemble the device”
“Nós usamos peças disponíveis e sobressalentes de automóveis locais para montar o dispositivo” (UNICEF, 2021, tradução nossa).
A notoriedade do grupo é inquestionável, porém as meninas da equipe relatam com tristeza que a realidade da maioria das meninas em seu país é bem diferente, envolvendo abusos, como casamento infantil e uma vida despendida completamente dentro de casa.
“I had classmates who dropped out of school due to early marriage” [2].
“Eu tive colegas de turma que sairam da escolha por causa do casamento”. (UNICEF, 2021, tradução nossa).
A equipe é um exemplo de que a história das meninas no Afeganistão pode ser diferente, porém a continuidade das conquistas e histórias inspiradoras da equipe “Afghan Dreamers” foi ameaçada em agosto de 2021, devido ao avanço do grupo Talibã no Afeganistão. A mentora do grupo postou em seu twitter:
Há uma insegurança e medo do grupo extremista, que se manteve no poder entre os anos de 1996 e 2001, adotar a mesma postura desta época retirando os direitos anteriormente conquistados pelas mulheres.
O anseio de algumas meninas do grupo Afghan Dreamers por continuar seus estudos e viver uma realidade diferente de suas colegas foi maior que o medo de abandonar a família e os amigos, buscando refúgio no exterior. A preocupação com as meninas que permanceram no país é constante, há ainda muita insegurança, principalmente quanto ao posicionamento do grupo Talibã perante as atividades permitidas para as mulheres no país, como o acesso aos estudos [4].
Para Roya a mentora do grupo, homens e mulheres devem ser capazes de progredir e a oportunidade ao estudo e a exercer sua profissão. E nós, da área de tecnologia, temos o dever de auxiliar nesse processo, usando a tecnologia como ferramenta de geração de trabalhos, que levam esperança para quem mais precisa [2].
“The most exciting potential for tech is the pathway it provides for quality education, healthcare, and the ability to include women and girls in the economy. If we can achieve these three goals, we can finally say that women’s voices are no longer silent.”
“A coisa mais empolgante na tecnologia é o caminho que ela oferece para educação de qualidade, saúde e a capacidade de incluir mulheres e meninas na economia. Se conseguirmos atingir esses três objetivos, podemos finalmente dizer que as vozes das mulheres não são mais silenciosas” (MAHBOOB, 2020, tradução nossa).
Referências
[1] Roya Mahboob. (n.d.). Home [LinkedIn page]. LinkedIn. Acessado em 11 de Setembro de 2021. https://www.linkedin.com/in/roya-mahboob-93946536/
[2] MAHBOOB R. Women, Girls, and STEM. In: MURTHY Padmini, ANSEHL Amy. (eds) Technology and Global Public Health. 1. ed. Springer, 2020. p. 21-22. DOI: https://doi.org/10.1007/978-3-030-46355-7_4
[3] UNICEF. From Dream to Reality: Afghan Dreamers Robotic Team. UNICEF, Canadá, 1 de set. de 2021. Disponível em: <https://www.unicef.ca/en/blog/afghanistan-girls-dream-reality>. Acesso em: 11 de set. de 2021.
[4]DEBUSMANN, Bernd. Afghan robotics team: Inspirational women begin new chapter. BBC News, Washington, 8 de set. de 2021. Disponível em: <https://www.bbc.com/news/world-asia-58496148>
Como citar este artigo:
CARMIN, Mariana. Afghan Dreamers – Como é a realidade das meninas afegãs na computação. SBC Horizontes, set. 2021. ISSN 2175-9235. Disponível em: <http://horizontes.sbc.org.br/index.php/2021/09/afghan-dreamers—como-e-a-realidade-das-meninas-afegas-na-computacao/>. Acesso em: DD mês. AAAA.
Sobre a autora
Mariana Carmin
Informata Biomédica formada pela UFPR. Mestranda do programada PPGINF/UFPR no laboratório de pesquisa HIPES.