Assim caminha a humanidade
Gosto muito de ficção-científica porque ela antecipa o futuro; e parece que Arthur C. Clarke sabia das coisas. No livro 2001: uma odisseia no espaço, ele anuncia: os fabricantes de ferramentas foram recriados por suas próprias ferramentas.
Migrando da ficção para a realidade, a gente pode afirmar que toda nova ferramenta gera uma nova rotina social. As plataformas de redes sociais, como Facebook e Instagram, alteraram a nossa forma de interagir com as pessoas e podemos dizer que mudaram até o conceito de amizade. O TikTok alterou a forma de produzir e consumir conteúdo. Aplicativos como Uber e iFood alteraram nossas rotinas de mobilidade e de alimentação. Esses são só alguns exemplos, a lista segue aumentando.
O que a gente vê hoje é que a nossa vida acontece de forma articulada com esses aplicativos. A gente tá sempre on com os nossos smartphones na mão. Os aplicativos são linhas de código – o software. O código não possui materialidade, mas expressa uma forma de como o mundo pode ser capturado, representado, processado, modelado computacionalmente.
O software importa. Ele modifica as condições por meio das quais a sociedade, o espaço e o tempo são organizados. Ele cria realidades que antes não existiam. Ele é produto e processo. Ele não surge do nada. Emerge como produto de muitas mentes. Ele é processo, faz as coisas acontecerem no mundo. O código é ação interna e externa, altera o estado da máquina e altera o viver e o conviver. É um produto do mundo, mas também funciona no mundo. Molda, em vários níveis, a forma como vivemos.
O software não pode ser pensado apenas como uma ferramenta que a gente usa quando precisa e depois guarda no armário. Ele já é um elemento constitutivo do humano. Somos nós juntos com ele. Entrelaçados. Acoplados. Misturados.
Vivemos hoje um mundo diferente. Não é, simplesmente, a fase conclusiva de uma época, mas é algo totalmente novo. Recriado. Sabemos que o software runs the world, o software roda o mundo, roda no mundo. E o mundo que hoje habitamos é um lugar difícil de definir, é informativo e material ao mesmo tempo.
Arthur C. Clarke sabia das coisas.
Arte: Joana Kuhn (@jururuart)
Revisão: Tiago Bergenthal
Como citar esse artigo:
BASSANI, Patrícia Scherer Assim caminha a humanidade. SBC Horizontes, 28 ago. 2023. ISSN 2175-9235. Disponível em: <https://horizontes.sbc.org.br/index.php/2023/08/assim-caminha-a-humanidade/>. Acesso em: DD mês. AAAA
Patrícia Scherer Bassani é doutora em Informática na Educação, professora titular do PPG em Diversidade Cultural e Inclusão Social na Universidade Feevale, na linha de pesquisa Linguagens e Tecnologias.
