Violação de contrato
Como seria viver uma vida completamente dividida? Habitar dois mundos totalmente desconectados? Isso é o que acontece na série de ficção científica chamada Ruptura. O título original é Severance e está disponível na Apple TV desde fevereiro de 2022. Ben Stiller assina a direção.
Na história, alguns funcionários da Lumon Industries aceitam participar de um experimento, onde suas memórias pessoais e suas memórias de trabalho são completamente fragmentadas. Quando eles entram na empresa, a memória de trabalho é ativada e a memória pessoal, desativada. O contrário acontece na saída. Uma realidade distópica, que possibilita a emergência de duas personalidades totalmente separadas. De um lado, a vida. De outro, o trabalho. Ou, como na série, o outie, que é a vida fora do trabalho, e o innie, que é a vida dentro do trabalho. Desconexão total.
Além da situação toda ser estranha, o trabalho também é muito incomum. Os innies passam os dias realizando tarefas repetitivas. Na verdade, ninguém sabe muito bem o objetivo. Também não há interação com outros setores da empresa. Grande parte da história acontece em uma pequena sala, minimalista, muito branco e muita luz artificial. Corredores longos e nada de janelas. Meio claustrofóbico para o meu gosto. Parece que falta ar.
Nessa mistura de sci-fi, drama e suspense, nada acontece, até que uma coisa acontece. Sabe aquela sensação estranha, quando a gente sente que tem alguma coisa diferente? Aquele pequeno incômodo, que nos faz levantar do sofá e acender a luz? Sabe aquele movimento que, quando a gente percebe, não dá mais pra parar? Aconteceu com Mark Scout, o funcionário interpretado por Adam Scott, e ele começa a investigar e buscar formas de conectar aquilo que deveria ser mantido separado. Nesse processo, ele contagia o grupo todo.
Falando em contágio, lembrei da pandemia. Ela provocou o deslocamento coletivo. As coisas mudaram de lugar e a vida ficou essencialmente centralizada em casa. Até hoje tem gente que não quer sair pra rua. Misturam innie e outie por pura transgressão.
Mas os chefões das big techs mandaram todo mundo voltar.
– O pessoal do laptop quer privilégios que ninguém tem – falou o bilionário.
Tem coragem de reclamar para o juiz? Com certeza a gente perde de 6×1.
Arte: Niki (@ jururuart)
Revisão: Tiago Bergenthal
Texto produzido durante o módulo Circuito Santa Sede (@oficinasantasede & @rubempenz).
Como citar esse artigo:
BASSANI, Patrícia Scherer. Violação de contrato. SBC Horizontes, 07 abr. 2025. ISSN 2175-9235. Disponível em: < https://horizontes.sbc.org.br/index.php/2025/04/violacao-de-contrato/gt;. Acesso em: DD mês. AAAA
Patrícia Scherer Bassani é doutora em Informática na Educação, professora titular do PPG em Diversidade Cultural e Inclusão Social na Universidade Feevale, na linha de pesquisa Linguagens e Tecnologias.
