O hardware é quântico mas o código pode ser em Python

Há alguns dias, meu pai me fez a seguinte pergunta:
Filha, o gerente do banco disse que tem investimentos em tecnologia quântica. Você acha uma boa?
Essa pergunta me deixou curiosa. Computação quântica me parece mais uma daquelas tecnologias futuristas que prometem mudar o mundo — mas que pouca gente realmente entende como funciona.
Neste texto eu não vou responder à pergunta do meu pai. Mas vou trazer alguns pontos importantes sobre o que está por trás de um computador quântico e quais são os seus principais desafios.
Computadores quânticos não vão substituir os supercomputadores
Diferente do que muitos pensam, os computadores quânticos não vieram para substituir os supercomputadores clássicos. Eles são uma nova ferramenta com um propósito específico: resolver problemas que seriam praticamente impossíveis para computadores convencionais.
Ou seja, eles não substituem — eles somam. Assim como as GPUs (placas gráficas) foram incorporadas para acelerar cálculos específicos, os computadores quânticos também se somam à infraestrutura já existente. Eles são especialmente promissores em áreas como simulação de moléculas, otimização complexa e criptografia.
Um computador quântico precisa de um digital — Programando com Python
Um computador quântico precisa de um computador clássico para funcionar. O controle e programação desses sistemas ainda são feitos por computadores tradicionais — o que significa que sim, podemos escrever código em Python para eles!
Mas atenção: escrever um código em Python para um computador quântico não é como escrever um código para um computador tradicional. Os problemas precisam ser traduzidos para circuitos quânticos, onde cada operação representa uma manipulação dos qubits (as menores unidades de informação quântica).

Fonte: Qibo https://github.com/qiboteam/qibo/blob/master/examples/qclustering/
Limitações físicas: o lado não tão glamuroso da computação quântica
Muitas vezes, imaginamos que a tecnologia vai evoluir em ritmo exponencial, como aconteceu com os transistores seguindo a famosa Lei de Moore. Porém, mesmo esse avanço já desacelerou por conta das limitações físicas no tamanho dos componentes.
A computação quântica, por sua vez, já nasce enfrentando desafios físicos enormes. Os qubits são extremamente sensíveis a qualquer interferência, e para mantê-los estáveis, é necessário resfriar os computadores a temperaturas próximas do zero absoluto (−273,15 °C). Esse resfriamento é feito com tecnologias avançadas, como o sistema de manipulação de gases Hélio-3 e Hélio-4. O que deixa o computador com cara de que foi tirado de algum filme de ficçao científica mas principalmente torna o uso desses computadores muito mais complexo.

E afinal, vale a pena investir?
Este texto não pretende responder se vale ou não a pena investir em computação quântica.
O objetivo é mostrar que, por trás das promessas futuristas, existe uma base científica real — com códigos em Python, temperaturas próximas ao zero absoluto e muita pesquisa acontecendo para tornar essa tecnologia viável no nosso dia a dia.
Sobre a autora

Mariana Carmin: Research Enginner no Barcelona Supercomputing Center e doutoranda no programa de Arquitetura de Computadores na Universidade Politécnica da Catalunha. Informata Biomédica formada pela UFPR. Mestre pelo programada PPGINF/UFPR no laboratório de pesquisa HIPES.
Referências
Brian Wang. “The End of Moore’s Law in Detail and Starting a New Golden Age.” NextBigFuture, February 2019. https://www.nextbigfuture.com/2019/02/the-end-of-moores-law-in-detail-and-starting-a-new-golden-age.html.
“Cool Technology Enables Quantum Computing.” Physics World, 16 March 2020. https://physicsworld.com/a/cool-technology-enables-quantum-computing/.
“Nobel Laureate: Quantum Computing Won’t Overtake Classical Machines Anytime Soon.” The Quantum Insider, 19 February 2025. https://thequantuminsider.com/2025/02/19/nobel-laureate-quantum-computing-wont-overtake-classical-machines-anytime-soon/.
Stavros Efthymiou, Sergi Ramos-Calderer, Carlos Bravo-Prieto, Adrián Pérez-Salinas, Diego García-Martín, Artur Garcia-Saez, José Ignacio Latorre, and Stefano Carrazza. “Qibo: A Framework for Quantum Simulation with Hardware Acceleration.” Quantum Science and Technology 7, no. 1 (2021): 015018. https://arxiv.org/abs/2009.01845