Empoderar pelo Design: a Experiência de um Curso Online de Artes Digitais em período de Quarentena
Por Thalia Santana, Letícia Camargo, Ramayane Braga, Natália Louzada e Adriano Braga
Entre os dias 22 e 29 de maio, o projeto Meninas Digitais no Cerrado, parceiro do Programa Meninas Digitais da Sociedade Brasileira de Computação (SBC) levou ações de capacitação técnica para além das fronteiras goianas. Pela primeira vez, de modo totalmente virtual e aberto a todas as pessoas, foi realizado o minicurso “Criando Artes Digitais: Curso Online de Canva”. A ação foi toda inédita, pois também tratou-se da 1ª atividade da equipe ao ensinar sobre a criação de designs para as diversas mídias digitais.
O projeto Meninas Digitais no Cerrado surgiu no ano de 2016, a fim de prover empoderamento feminino em ciência e tecnologia, integrando o Núcleo de Estudos e Pesquisa em Tecnologia da Informação (NEPeTI). Com quase cinco anos de atuação, já figurou como projetos de ensino, pesquisa e extensão, com envolvimento direto de estudantes de cursos ligados à informática. Inclusive foi decorrente do desejo das meninas do ensino médio técnico em Informática para Internet e bacharelado em Sistemas de Informação, quanto ao aprendizado de designs, que esta ação tomou forma. Quando questionadas sobre o que gostariam de aprender mesmo “de casa”, inegavelmente, as artes foram parte do repertório solicitado pelas discentes. Além de reforçar o caráter interdisciplinar que as artes são capazes de produzir junto às tecnologias digitais, comumente, os projetos parceiros do Programa Meninas Digitais criam artes para divulgar suas ações e se aproximar do público virtual via redes sociais, o que também estimulou a realização do curso.
Com apenas dois dias de divulgação, foram efetuadas quase 250 inscrições por pessoas de todo o país, sendo cerca de 77% do público externo ao Campus Ceres do Instituto Federal Goiano – instituição a qual sedia o projeto. Desde o início, a expectativa já era grande, visto os diversos comentários das pessoas participantes, como: “Parabéns pela iniciativa, nessa época de pandemia o aprendizado ajuda a manter o foco” ou mesmo “Tenho muita vontade de aprender, sempre gostei dessas coisas”. Assim o entusiasmo se refletiu na equipe de ministrantes, que ficaram animadas(os) com a proporção e impacto gerado pela ação.
Como o número de inscritos excedeu o previsto, a iniciativa dividiu as pessoas inscritas em quatro turmas, cada uma com 2h de duração, em busca de maior efetividade no quesito ensino-aprendizagem. O curso foi ofertado por meio da plataforma Google Meet em forma de webconferência, de modo totalmente gratuito e com direito à certificado de extensão. No total, 110 das pessoas inscritas compareceram ao curso, provenientes de 14 estados distintos, sendo: Rio de Janeiro, São Paulo, Maranhão, Ceará, Pará, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Bahia, Paraná, Pernambuco, Rio Grande do Norte, Distrito Federal, Mato Grosso e claro, Goiás.
A ementa tratou especificamente da plataforma de criação de designs Canva, que apesar de possuir nomenclatura muito parecida com outra metodologia, designa-se à uma ferramenta de fácil utilização com objetivo de produção de artes digitais, bem como edição de imagens e slides. As pessoas cursistas interagiram de maneira ativa com as ministrantes (ambas mulheres discentes do curso de Bacharelado de Sistemas de Informação e integrantes da equipe do projeto), seja por meio de voz e vídeo, ou ainda, pelo bate papo dinâmico ofertado pela plataforma de webconferência.
Buscando oportunizar a compreensão e aprendizado de todo o público, a utilização da Canva se deu tanto via computadores, quanto via dispositivos móveis, e, além disso, discutiu-se todos os elementos essenciais para criação de um design, desde quadros, fontes, fundos, bem como conhecimentos introdutórios sobre colorimetria e tipografia.
Com um público majoritariamente feminino (88,2%), discussões de gênero foram tecidas em meio ao curso. Durante a apresentação das responsáveis pela promoção da atividade online, ao apresentar o projeto Meninas Digitais no Cerrado, foi indagado aos ouvintes acerca da disparidade entre homens e mulheres na Computação e sobre como houve um afastamento da presença feminina na área, apresentando inclusive a icônica foto da Primeira Turma de Ciência da Computação da Universidade de São Paulo (USP) ingressante em 1971, a qual era composta em maioria (70%) por mulheres (SANTOS, 2017).
Ademais, a proposta desenvolvida deu destaque a co-fundadora e CEO da plataforma Canva, Melanie Perkins (32 anos), cuja atuação como coordenadora de uma das startups de tecnologia mais valiosas do mundo (LEE, 2019), dialoga mais uma vez com perfis de êxito capazes de encorajar meninas e instigar sua permanência no setor.
Nesse contexto, é de extrema importância a valorização de uma ferramenta criada por uma mulher, considerada como uma das CEOs mais importantes da tecnologia nos dias atuais. Também foi exibido um vídeo depoimento da designer Ianka Assis, que contou sobre esta profissão no mercado e deu dicas práticas na produção de peças digitais.
Pluralidade foi uma palavra-chave na ação. Além de estados diferentes, pessoas de diversos cursos e profissões participaram do curso, sendo 33,9% da área de computação. Houve uma expressiva participação de bibliotecárias(os), com vistas a divulgação de seu trabalho nas instituições, além de profissionais e discentes de áreas como Psicologia, Direito, Agronomia, Ciências Biológicas, Jornalismo, Publicidade e Turismo, o que reforçou a importância das artes, no contexto atual da pandemia da COVID-19, para abrir portas para o trabalho das pessoas.
Sem dúvidas, o curso foi libertador! Para aquelas pessoas que achavam que criar artes é somente possível para quem é da área de Informática, desconstruiu-se tal conceito neste encontro épico, no qual, ao final, todas as pessoas saíram da chamada de vídeo com direito a uma arte final pronta para publicação e uso. Para isso, foi proposta a criação de um cartaz com mulheres inspiradoras nas ciências, com ênfase na área de Computação, por meio do re(conhecimento) de nomes como Ada Lovelace, Grace Hopper, Camila Achutti e Katie Bouman, e assim, colaborando para evidenciar perfis femininos de êxito, frequentemente omitidos da história (LOUZADA et al., 2019).
Se tudo já parecia incrível, os comentários das pessoas participantes demonstraram, mais uma vez, a importância destas ações sociais de capacitação, mesmo em tempos de isolamento social.
“Excelente abordagem das ministrantes, com interesse pelo público,
rápida solução das dúvidas apresentadas e dinamismo na apresentação
do conteúdo. Bom humor com sofisticação e conteúdo.” - Participante A
“Parabéns pelo projeto, pela iniciativa e por todo trabalho e dedicação.
Adorei o minicurso!!! A abordagem tão humana nos aproxima muito!
Continuem inspirando as meninas do nosso Brasil <3” - Participante B
“Parabéns pelo curso. Sempre utilizei o Canva.
Agora me sinto com maior confiança para criar artes digitais.”
- Participante C
“Foi ótimo! Fiz o curso com minha filha, de 9 anos, que também adorou!!
Está inspirada com o Canva a fazer várias artes” - Participante D
“Continuem investindo nessa área e agregando mais mulheres na área de TI,
produzindo conteúdo e criando arte. Valeu!” - Participante E
Unir, sem reunir, impacta pessoas. Estar juntas(os), mesmo de casa, aprendendo, transformando e não se sentindo sós. As ações do projeto Meninas Digitais no Cerrado e demais projetos parceiros do Programa Meninas Digitais são claras demonstrações de empatia, sororidade, liberdade e da grande importância de se acreditar no que se faz, mesmo em momentos que parecem tão sombrios. Se perguntarem como um curso de criação de artes digitais relaciona-se ao intuito do projeto, diga que empoderamos Meninas Digitais e outras pessoas por meio do design.
Para quem se interessou e quer conhecer mais da ferramenta, pode acessar o canal do YouTube das Meninas Digitais no Cerrado (https://www.youtube.com/channel/UCxeypXbQ8W88W0F_xGZ-rjA, e assistir à gravação do curso. Os materiais também estão disponíveis no site do projeto: http://meninasdigitaisnocerrado.com.br/.
Referências:
LEE, Yoolim. The 32-Year-Old Founder of Startup Canva Gets $3.2 Billion Value. Disponível em: <https://www.bloomberg.com/news/articles/2019-10-16/32-year-old-female-ceo-s-startup-gets-3-2-billion-valuation>. Acesso em: 02 de junho de 2020.
LOUZADA, Natália; SANTANA, Thalia; ASSIS, Ianka; BRAGA, Ramayane; BRAGA, Adriano. Agindo sobre a diferença: atividades de empoderamento feminino em prol da permanência de mulheres em cursos de Tecnologia da Informação. In: WOMEN IN INFORMATION TECHNOLOGY (WIT), 13., 2019, Belém. Anais do XIII Women in Information Technology. Porto Alegre: Sociedade Brasileira de Computação, july 2019 . p. 69-78.
SANTOS, Carolina Marins. Por que as mulheres “desapareceram” dos cursos de computação?. 2017. Disponível em: <https://jornal.usp.br/universidade/por-que-as- mulheres-desapareceram-dos-cursos-de-computacao/>. Acesso em: 02 de junho de 2020.
Como citar este artigo:
Santana, T.; Camargo, L.; Braga, R.; Louzada, N.; Braga, A. Empoderar Meninas pelo Design: a Experiência de um Curso Online de Artes Digitais em período de Quarentena. SBC Horizontes. ISSN: 2175-9235. Disponível em: http://horizontes.sbc.org.br/index.php/2020/06/15/empoderar-pelo-design/
Sobre as(os) autoras(es):
Thalia Santana
Bacharela em Sistemas de Informação pelo Instituto Federal Goiano – Campus Ceres (2019). Concluiu o Curso Técnico em Informática Integrado ao Ensino Médio, pela mesma instituição (2014). Atuou como bolsista de Iniciação Científica pelo PIBIC/IF GOIANO, além de compor equipe em projetos de extensão e ensino. É colaboradora do projeto Meninas Digitais no Cerrado, bem como do Núcleo de Estudos e Pesquisa em Tecnologia da Informação (NEPeTI).
http://lattes.cnpq.br/8063677996827079
Letícia Camargo
Acadêmica do curso de bacharelado em Sistemas de Informação. É técnica em Informática para Internet Integrado ao Ensino Médio do Instituto Federal Goiano – Campus Ceres (2019). Atuou como bolsista da Iniciação Científica Júnior pelo CNPq do projeto Meninas Digitais no Cerrado.
http://lattes.cnpq.br/8688881629760593
Ramayane Braga
Especialista em MBA em Governança de TI pela UniCEUMA (2012) e possui graduação em Sistemas de Informação pela Universidade Estadual de Goiás (2009). Atua como professora da área desde 2009, sendo atualmente professora do Instituto Federal Goiano – Campus Ceres, ministrando na área de Engenharia de Software. Coordena projetos na área de Educação e no empoderamento de meninas na computação (Meninas Digitais no Cerrado). Mãe da Bianca.
http://lattes.cnpq.br/1546759042373798
Natália Louzada
Professora no Instituto Federal de Educação Ciência e Tecnologia Goiano Campus Ceres e estudante de doutorado no Programa de Pós-graduação em História da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP). Possui formação acadêmica em História: mestrado pela Universidade Federal de Goiás (UFG) e graduação pela Universidade Estadual de Goiás (UEG). Atualmente, desenvolve pesquisa de doutorado sobre o tombamento federal de terreiros de candomblé, e faz parte da equipe do Projeto Meninas Digitais no Cerrado, sendo responsável pelas discussões de gênero, sexualidade e introdução ao pensamento feminista.
http://lattes.cnpq.br/5310233571344597
Adriano Braga
Mestre em Ciência da Computação pela Universidade Federal de Goiás (2013) e possui graduação em Sistemas de Informação pela Universidade Estadual de Goiás (2008). Atualmente é professor efetivo do Câmpus Ceres do Instituto Federal Goiano (IF Goiano) e atua como Diretor de Ensino desde o ano de 2016. Revisor de 4 congressos científicos e tem experiência na área de Ciência da Computação, com ênfase em Mineração de Dados, atuando principalmente nos seguintes temas: recuperação de informações, mineração de dados, análise bibliográfica, algoritmos para o ensino básico, banco de dados, gênero e evasão escolar. Pai da Bianca.
http://lattes.cnpq.br/3670394035811712