Grace Hopper: Ouse e Faça
Por Marina Pereira de Souza
Revisão: Alane Marie de Lima, Heloise Acco Tives e Sílvia Amélia Bim
Edição: Heloise Acco Tives
Esse texto foi produzido no contexto da disciplina optativa Computação e Sociedade ofertada para estudantes de Sistemas de Informação e Engenharia da Computação da Universidade Tecnológica Federal do Paraná – campus Curitiba. A disciplina foi conduzida de forma remota no semestre 2022.1.
Grace Hopper foi professora, matemática, cientista de computação e Almirante da Marinha dos Estados Unidos. Nascida em 1906 na cidade de Nova York, Grace Brewster Murray era a mais velha de três irmãos. Seu pai Walter Fletcher Murray Walter era corretor de seguros, e sua mãe Mary Campbell Van possuía um amor pela matemática que foi passado para Grace. Ambos acreditavam que suas duas filhas deveriam ter uma educação da mesma qualidade que seu filho. Seu bisavô Alexander Wilson Russell foi um almirante da marinha dos Estados Unidos e lutou na batalha de Mobile Bay (Williams, 2004).
Em sua infância, Grace passava os verões com seus primos em sua casa de campo no lago de Wentworth em Wolfeboro, New Hampshire. Eles brincavam de jogos como chutar a lata, esconde-esconde e policiais e ladrões. Ela se dedicava à hobbies de bordado, leitura e piano. Grace era uma criança fascinada por máquinas e muito curiosa. Quando tinha sete anos, ela desmontou seu despertador para descobrir como ele funcionava. Como não conseguiu remontá-lo, ela desmontou mais sete relógios de sua casa, até sua mãe descobrir o que estava acontecendo e a limitou a usar apenas um relógio (Dickason, 1992).
Grace estudou nas escolas particulares para meninas Graham e Schoonmakers. Estudou na escola Hartridge em 1923, um ano depois de ser recusada pela faculdade Vassar por sua prova de Latim. No ano seguinte, ela foi aceita na faculdade de Vassar, onde estudou matemática e física, graduando-se em 1928. Após sua graduação, iniciou um estudo de matemática na universidade de Yale com uma bolsa da faculdade de Vassar. Sua carreira como professora de matemática em Vassar teve início em 1931 e em 1934 ela obteve um Ph.D. em matemática pela universidade de Yale. Em 1930 Grace Murray casou-se com Vicent Foster Hopper, professor de inglês na universidade de Nova York. Em 1945 o casal se divorciou e Grace não se casou novamente (O’CONNOR, 1999).
Quando os Estados Unidos entraram na Segunda Guerra Mundial em 1939, Grace quis entrar para as forças armadas. Sua idade de 34 anos estava além do permitido para alistamento e também ela não possuía o peso considerado mínimo para sua altura. Mesmo sendo informada que seu trabalho como professora de matemática em Vassar era uma importante forma de servir seu país no período de guerra, ela queria ter uma atuação mais ativa e conseguiu persuadir a Reserva Naval a aceitá-la em 1943 e conseguiu licença da faculdade de Vassar (Williams, 2004).
Após treinamentos iniciais ela foi enviada para o Projeto de Computação do Bureau of Ordnance nos laboratórios Cruft da Universidade de Harvard. Lá, ela teve a oportunidade de trabalhar com o computador Harvard Mark I. Para ela este computador era um aparelho atraente, semelhante aos despertadores de sua juventude e tornou-se a terceira pessoa a programá-lo. Ao final da Segunda Guerra Mundial Hopper estava trabalhando com o computador Harvard Mark II, no qual foi encontrado o primeiro “bug”. Uma mariposa foi encontrada em um dos relés do computador, e Grace a prendeu em seu diário de bordo escrevendo “First actual case of bug being found” (Williams, 2001), conforme pode ser observado na Figura 1.
Grace terminou suas atividades na Marinha em 1946 mas permaneceu como reservista. Ela reassumiu sua posição na faculdade de Vassar para permanecer em Harvard, onde obteve uma bolsa de pesquisa em Ciências da Engenharia e Física Aplicada no Laboratório de Computação. Dessa forma ela continuou trabalhando no computador Harvard Mark II e posteriormente no Harvard Mark III (O’CONNOR, 1999).
Em 1949 Hopper entrou para Eckert-Mauchly Computer Corporation como matemática sênior, onde trabalhou no computador UNIVAC com John Eckert e John Mauchly. Nesta empresa ela sugeriu o desenvolvimento de uma linguagem de programação que utilizasse somente palavras em inglês, mas foi desmotivada pelos colegas que disseram rapidamente que ela não poderia fazer isso, pois computadores não entendiam inglês. Ela insistiu, pois, ao seu ver seria muito mais fácil para a maioria das pessoas escrever uma declaração em inglês do que utilizando símbolos. Grace então decidiu que os profissionais deveriam poder escrever seus programas em inglês, e os computadores iriam traduzir em código de máquina (Ann, et al., 2004).
Sua ideia não foi facilmente aceita por três anos, então ela publicou um artigo sobre o tema e em 1952 ela possuía um carregador de link operacional, ao qual ela chamou de compilador. Foi o primeiro compilador de processamento de dados em inglês, e ninguém conseguia acreditar em seu feito. Este foi o início do COBOL (Common Business-Oriented Language), uma linguagem de programação de alto nível. Segundo Grace, o motivo de ter desenvolvido um compilador foi que ela era preguiçosa e esperava que assim o programador de computadores pudesse voltar a ser um matemático (O’CONNOR, 1999). Na Figura 2, observa-se Grace com o computador UNIVAC, segurando um material sobre COBOL.
Em 1959 ocorreu um evento com experts em computadores da indústria e do governo, chamado Conferência sobre linguagens de sistemas de dados. Hopper serviu como consultora técnica do comitê deste então, que também contava com alguns de seus ex-funcionários. Este comitê estendeu uma linguagem de Hopper chamada Flow-Matic, que é uma linguagem de programação assemelhada ao inglês, e definiu a nova linguagem COBOL, que passou a ser a linguagem de negócios mais onipresente até hoje (Gilbert, 1981).
Entre 1967 e 1977 Grace retornou à Marinha e serviu como diretora do Grupo de Linguagens de Programação da Marinha no Escritório de Planejamento de Sistemas de Informação e foi promovida ao posto de Capitã em 1973. Ela escreveu um software de validação para COBOL e seu compilador como parte do programa de estandardização do COBOL para toda a Marinha. Ainda neste período na Marinha, ela foi professora de Ciências da Administração entre 1971 e 1978 na Universidade George Washington (Beyer, 2009).
Grace Hopper foi promovida à Contra-Almirante Hopper em 1983 durante uma cerimônia na Casa Branca. Ela se aposentou da Marinha em 1986, com 80 anos de idade sendo a oficial em atividade mais velha dos Estados Unidos. Em uma comemoração de sua aposentadoria, recebeu a Medalha de Serviços Distintos de Defesa, o maior prêmio possível pelo Departamento de Defesa. Na Figura 3, Grace Hopper está em seu uniforme da Marinha dos Estados Unidos.
Após sua aposentadoria continuou como palestrante em conferências, trabalhando como consultora e participando de programas educacionais até sua morte em 1992. Ela acreditava muito em mentoria, e explicou que a coisa mais importante que fez além de construir o compilador, foi ensinar os jovens (LANTERO, 2015). Sempre mentoreou os estudantes incentivando suas ações e os auxiliando. Grace foi a segunda mulher a ser homenageada com um navio, chamado USS Hopper, que é um navio tipo destroyer ainda em atividade, com o lema “aude et effice – ouse e faça” (RUBIO, 2018).
Grace Hopper inspira em sua dedicação aos trabalhos e estudos e por sua perseverança. Em diversas situações suas ações e ideias não foram aceitas, mas isso não a impediu de continuar tentando até alcançar seus objetivos.
Atualmente, existe um evento anual chamado Grace Hopper Celebration, que celebra o legado de Grace Hopper, trazendo inspiração e pesquisas a temas de interesse para carreiras de mulheres na computação. Atualmente é considerado o maior evento de mulheres tecnólogas do mundo, onde as mulheres do mundo todo se reúnem para aprender, criar conexões e celebrar suas conquistas. (Grace Hopper Celebration, 2022).
Referências:
MARINHO, Adília. Curiosidades sobre a matemática norte-americana Grace Hopper (1906- 1992). Sociedade Portuguesa de Matemática. Disponível em:
https://clube.spm.pt/news/curiosidades-sobre-a-matemtica-norte-americana-grace-hopper 1906-1992 . Acesso em 09 de Abril de 2022.
RUBIO, Isabel. VALDÉS, Isabel. Grace Hopper, a mulher que tornou a linguagem do computador mais humana. El País. Disponível em:
https://brasil.elpais.com/brasil/2018/02/23/ciencia/1519391635_401299.html . Acesso em 09 de Abril de 2022.
LANTERO, Allison. Five Fast Facts About Technologist Grace Hopper. Energy. Disponível em: https://www.energy.gov/articles/five-fast-facts-about-technologist-grace-hopper . Acesso em 09 de Abril de 2022.
O’CONNOR, J J. ROBERTSON, E F. Grace Brewster Murray Hopper. MacTutor. Disponível em: https://mathshistory.st-andrews.ac.uk/Biographies/Hopper/ . Acesso em 09 de Abril de 2022.
Grace Hopper. Wikipédia. Disponível em: https://en.wikipedia.org/wiki/Grace_Hopper . Acesso em 09 de Abril de 2022.
Grace Hopper Celebration. 2022. Disponível em: https://ghc.anitab.org/ . Acesso em 05 de Julho de 2022.
Dickason, Elizabeth. Looking Back: Grace Murray Hopper’s Younger Years. 1992 Disponível em: https://www.thoughtco.com/the-younger-years-of-grace-murray-hopper-4077488 . Acesso em 09 de Abril de 2022.
Williams, Kathleen Broome. Grace Hopper: Admiral of the Cyber Sea. Naval Institute Press. 2004. Disponível em: https://books.google.com.br/books?id=KKmiw-_2gYIC&q=%22Grace+Hooper%22+and+military+ranks&pg=PR9&redir_esc=y#v=onepage&q&f=false . Acesso em 09 de Abril de 2022.
Williams, Kathleen Broome. Improbable Warriors: Women Scientists and the U.S. Navy in World War II. 2001. Annapolis, Maryland: Naval Institute Press.
Ann., Camp, Carole. American women inventors. 2004. Berkeley Heights, NJ: Enslow Publishers.
Gilbert, Lynn. Women of Wisdom: Grace Murray Hopper. 1981. Lynn Gilbert, Inc.
Beyer, Kurt W. Grace Hopper and the Invention of the Information Age. 2009. Cambridge, Massachusetts: MIT Press.
Stringfixer. Grace Hopper. Disponível em: https://stringfixer.com/pt/Grace_Hopper . Acesso em 09 de Abril de 2022.
Sobre a autora:
Marina Pereira de Souza. Estudante de Engenharia de Computação pela Universidade Tecnológica Federal do Paraná. Em seu tempo livre adora leitura, arte digital e jogos de computador, especialmente RPG. Gosta de cabelos coloridos, gatos e Rock’n’ Roll. Desenvolvedora Front-End com paixão por acessibilidade e inclusão digital. |
Como citar este artigo
SOUZA, Marina Pereira de. Grace Hopper: Ouse e Faça. SBC Horizontes, agostode 2022. ISSN 2175-9235. Disponível em: http://horizontes.sbc.org.br/index.php/2022/08/grace-hopper-ouse-e-faca/. Acesso em: DD mês AAAA.