Aprendizagem online é em rede, colaborativa: para o aluno não ficar estudando sozinho a distância
Por: Mariano Pimentel; Felipe da Silva Ponte de Carvalho (2/6/2020)
Edição: Renata Araujo
Ilustrações: Monica Lopes (do canal IlustrAqui)*
Revisão: Alvanisio Damasceno
No texto de abertura desta série sobre “Princípios da Educação Online” (PIMENTEL; CARVALHO, 2020), apontamos que, na Educação Online, a aprendizagem é em rede, colaborativa. Esse princípio se contrapõe à aprendizagem individualista típica da abordagem instrucionista-massiva frequentemente adotada na Educação a Distância (EAD), na qual o aluno interage predominantemente com os conteúdos da disciplina. Na perspectiva da Educação Online, como aqui temos caracterizado, partimos do reconhecimento de que somos atravessados por processos formativos de múltiplas redes educativas (ALVES, 2017) e do reconhecimento de que aprendemos em rede. Queremos, no presente texto, justificar esse princípio. Para isso, partimos dos estudos ciberculturais (LÉVY, 1999; LEMOS, 2009; SANTAELLA, 2013; CASTELLS, 1999), levando em consideração o cenário social e técnico de nosso tempo. Também justificamos esse princípio a partir de um ideário pedagógico e de fundamentos de teorias de aprendizagem. Terminamos refletindo sobre o que os estudantes disseram sobre a aprendizagem colaborativa experienciada na modalidade a distância.
Por que a cibercultura nos leva a pensarpraticar a aprendizagem em rede?
A cibercultura emerge da passagem da Sociedade Industrial para a nossa atual Sociedade em Rede, da Informação, da Comunicação, do Conhecimento, Conectada, Digital, Pós-industrial – seja lá qual for o nome que irá caracterizar a nossa sociedade contemporânea, o que todas essas denominações apontam é para uma transformação radical, uma verdadeira revolução que estamos vivenciando em decorrência do desenvolvimento e popularização das redes de computadores, uma tecnologia disruptiva que tem modificado não apenas hábitos e formas de agir, mas está gerando profundas transformações em praticamente todas as áreas da experiência cotidiana, de nossos modos de ser e estar no mundo (NICOLACI-DA-COSTA; PIMENTEL, 2011; NICOLACI-DA-COSTA, 2000; NICOLACI-DA-COSTA, 1998).
A cibercultura pode ser caracterizada a partir de alguns princípios, sendo um deles a “conexão generalizada em rede”, que tem como pressuposto a ideia de que “é preciso emitir em rede, entrar em conexão com outros, produzir sinergias, trocar pedaços de informação, circular, distribuir […] vemos crescer as formas de produção e o consumo informacional pela produção livre, pela circulação e por processos colaborativos” (LEMOS, 2009, p. 38-39). A conexão generalizada em rede potencializa a emergência de grupos e de comunidades online, que vêm possibilitando processos formativos em rede por meio da aprendizagem colaborativa: “O ponto principal aqui é a mudança qualitativa nos processos de aprendizagem. […] A direção mais promissora, que por sinal traduz a perspectiva da inteligência coletiva no domínio educativo, é a da aprendizagem cooperativa.” (LÉVY, 1999, p.170-171)
Reconhecemos um anacronismo entre a cultura contemporânea e o sistema educacional, que está fundamentado nos princípios tayloristas emergentes na Sociedade Industrial e que toma a fábrica como modelo para pensar a escola (SILVA, 2002). Esse modelo de escola e sua abordagem pedagógica tecnicista-instrucionista-comportamentalista-disciplinar-descontextualizada-seriada-massiva estão se tornando cada vez mais insustentáveis em tempos de cibercultura.
“Prefeitura do Rio compara escola a linha de produção em propaganda e é criticada”
(Fonte: Último Segundo – iG, 09/12/2014)
Pesquisadores vêm apontando que o sistema educacional entra em simbiose com o modo de ser e estar em sociedade. Numa apresentação sobre a “Educação 3.0” (LENGEL, 2013), foi retratado o alinhamento entre o ambiente de trabalho e o sistema educacional de cada espaço-tempo social, com o objetivo de denunciar que a nossa escola atual ainda carrega as marcas da sociedade industrial e, dessa maneira, encontra-se em dessintonia com as práticas laborais e o ambiente de trabalho característicos de nossa época:
Destacamos, contudo, que o papel da Educação não é formar apenas para o mercado de trabalho. Compreendemos que a Educação é um meio para promover a apropriação de uma dada cultura, seus conhecimentos, práticas, valores, costumes, condutas, artefatos… Por isso, a escola precisa estar alinhada com a cultura contemporânea, sendo que as práticas laborais também fazem parte da cultura, como também os meios de comunicação, os desenvolvimentos tecnológicos, as ciências, as artes, a moda, a estética, a política, a economia, os modos de produção-distribuição-consumo etc.
Fonte: HAPNER et al., 1980 (p.92-93)
Compreendemos a escola como uma importante “peça da engrenagem” da sociedade; contudo, não estamos dizendo que a finalidade da escola seja apenas perpetuar a cultura e seus sistemas opressores. Reconhecemos a complexidade da Educação e compreendemos que a escola deve contribuir também para criticar e transformar a cultura e a sociedade em que está inserida (ARAUJO; PIMENTEL, 2020).
As tecnologias digitais em rede implicam a aprendizagem em rede?
As tecnologias digitais em rede – incluindo os computadores em rede e os sistemas computacionais que potencializam as interações sociais (web social, redes sociais, sistemas colaborativos, serviços de comunicação, mídias sociais etc.) – vêm modificando nossas concepções e práticas no campo educacional.
A História da Informática na Educação no Brasil: uma narrativa em construção (ELIA, 2020)
Podemos reconhecer que os computadores são usados na Educação a partir de três concepções distintas sobre a sua finalidade: como máquina de ensinar, como ferramenta de autoria e como meio de interação social.
É certo que a Educação a Distância foi e continua sendo impulsionada pelos computadores em rede, pela popularização das Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC). Contudo, apesar das tecnologias digitais em rede terem potência para promover a interação social, no contexto da EAD essas tecnologias são geralmente usadas como um meio de difusão de conteúdos. Nessa perspectiva, os computadores em rede representam uma “evolução” das mídias, que inauguraram uma terceira geração da Educação a Distância, mas não modificaram o modelo de comunicação de massa, predominantemente unidirecional, típico das gerações predecessoras (SANTOS, 2009).
As práticas tecnicistas (SAVIANE, 1986) em rede têm deixado muitos professores de cabelo em pé, inclusive nós, autores deste artigo. Velhas práticas pedagógicas, já combatidas no campo educacional, hoje estão revestidas pelas TIC, que dão suporte ao “neotecnicismo” (FREITAS, 2013). São essas mesmas tecnologias que também dão suporte à concepção da Educação Online, com aprendizagem em rede, colaborativa, usadas numa perspectiva pós-massiva, para promover a interatividade, com inspiração em práticas da cibercultura. Não há, portanto, um determinismo tecnológico, pois as mesmas tecnologias estão sendo apropriadas para efetivar diferentes perspectivas didático-pedagógicas.
A partir desses fundamentos, conseguimos dar uma resposta para a questão que intitula esta seção: as tecnologias digitais em rede implicam a aprendizagem em rede? Acho que você já sabe a nossa resposta: NÃO. Temos visto as redes de computadores serem usadas tanto como uma mídia de massa para promover o neotecnicismo quanto para promover a aprendizagem em rede, colaborativa.
Colaboração, interatividade, dialógica, autonomia, democracia e diversidade são alguns dos princípios que fazem parte de um ideário pedagógico que temos perseguido por mais de cem anos e que, talvez pelo viés das tecnologias digitais em rede, encontraremos um meio para colocá-lo em prática (NÓVOA, 2015). Ou talvez não.
Fonte: https://www.facebook.com/watch/?v=766881440068891 [7min]
Partimos do pressuposto de que, para pensarfazer a Educação Online, é preciso dialogar com o cotidiano do aprendente e compreender as suas práticas de cultura, envolvê-lo em processos formativos por meio de cocriações, com conteúdos e atividades que promovam a tecedura de conhecimentos na relação todos com todos. Queremos valorizar as redes em vez do individualismo moderno, a colaboração em vez da competição, a horizontalidade em vez da hierarquia, a coordenação-mediação em vez do comando-controle, o trabalho intelectual em vez do repetitivo, a criatividade-invenção em vez da memorização-repetição, a dialógica-negociação em vez da disciplina.
Temos um cenário tecnológico que dá suporte e potencializa esse ideário pedagógico; e vivemos uma (ciber)cultura que nos demanda estar em rede, trabalhar em grupo. É considerando esse cenário sociotécnico que a aprendizagem colaborativa, em rede, vem ganhando cada vez mais visibilidade.
Mas aprendizagem não é um processo individual?
Fonte: https://youtu.be/_BZtQf5NcvE
Vygotsky descobriu que, para melhorar o nível da aprendizagem, mais do que o indivíduo agir sobre o meio, precisava inter-agir. Para ele, todo sujeito adquire seus conhecimentos a partir de relações interpessoais, de troca com o meio, por isso é chamado de interativo. Vygotsky afirma que, aquilo que parece individual na pessoa, é, na verdade, resultado da construção da sua relação com o outro, um outro coletivo, que vincula a cultura. As características e atitudes individuais estão profundamente impregnadas das trocas com o coletivo e justamente é ali, no palco da cultura, dos seus valores, da negociação de sentidos tramada pelos grupos sociais, que se constrói e se internaliza o conhecimento. (UNIVESP, s.d.)
Aprendizagem colaborativa é uma abordagem pedagógica na qual, por meio do estudo em grupo, pela troca entre os pares, as pessoas envolvidas aprendem tecendo saberes juntas. Essa abordagem inspira-se na colaboração, que é a realização em grupo de um trabalho visando a alcançar um objetivo comum (PIMENTEL; FUKS, 2011; BARROS, 1994).
Costumamos destacar, da colaboração, três dimensões: a comunicação, caracterizada pela troca de mensagens, pela argumentação e pela negociação entre pessoas; a coordenação, caracterizada pelo gerenciamento de pessoas, atividades e recursos; e a cooperação, caracterizada pela atuação conjunta num espaço compartilhado para a produção de artefatos ou informações (ELLIS; GIBBIS; REIN, 1991; FUKS et al., 2011; VIVACQUA; GARCIA, 2011). Nessa perspectiva, o professor assume o papel de um coordenador-mediador da turma, responsável por arquitetar situações de aprendizagem que visam a promover a interatividade entre todos (comunicação), a coautoria e a cocriação de conhecimentos (cooperação).
A mudança mais significativa de uma aula instrucionista para uma experiência de aprendizagem colaborativa está relacionada aos papéis assumidos por alunos e professores: AMBOS são tecedores de conhecimentos no processo formativo; o que requer uma reconfiguração da estrutura hierárquica e das relações de poder entre professor e aluno. Para promover a aprendizagem colaborativa, é preciso uma mediação docente ativa (SANTOS; CARVALHO; PIMENTEL, 2018) que promova a interatividade (SILVA; 2000), a conversação (PIMENTEL; ARAUJO, 2020a), a avaliação formativa e colaborativa (SANTOS; LIMA, 2016). No quadro a seguir, destacamos algumas das diferenças entre a aprendizagem colaborativa e a aprendizagem individualista (com base em CAMPOS et al., 2003; SANTORO, PIMENTEL, 2009; CASTRO; MENEZES, 2011; BORGES, 2011; SOUZA; SAMPAIO; COSTA; ESTEVES, 2011):
Aprendizagem Colaborativa |
Aprendizagem Individualista |
Estudo em grupo, em colaboração com os colegas da turma |
Estudo sozinho, em competição com os demais da turma |
Aprendizagem decorrente da interatividade, construção ativa e investigativa |
Aprendizagem decorrente da recepção-assimilação, repetição e memorização |
Atividades autorais e discussões |
Atividades repetitivas, questionários e exercícios de fixação |
Professor atua como mediador/coordenador/líder |
Professor atua como palestrante/certificador/chefe |
Conhecimento aberto a intervenções, a ser tecido por meio da interação social (interatividade), por diferentes pontos de vista |
Conhecimento fechado, a ser apreendido de conteúdos e de apresentações do professor, de um ponto de vista único (do autor/professor) |
Ênfase no processo, |
Ênfase no produto, |
Avaliação continuada, formativa e realizada colaborativamente |
Avaliação pontual, somativa e realizada pelo professor |
A aprendizagem colaborativa está fundamentada nas seguintes tendências pedagógicas e teorias de aprendizagem: “a) Movimento da Escola Nova; b) Teorias da Epistemologia Genética de Piaget; c) Teoria Sociocultural de Vygotsky; d) Pedagogia Progressista.” (TORRES; IRALA, 2014, p. 70). Pesquisadores (FREITAS; FREITAS, 2003, p.21 apud TORRES; IRALA, 2014, p.89) apontam alguns benefícios em se empregar a aprendizagem colaborativa, como os listados a seguir:
- Melhoria das aprendizagens na escola;
- Melhoria das relações interpessoais;
- Melhoria da autoestima;
- Melhoria das competências no pensamento crítico;
- Maior capacidade em aceitar as perspectivas dos outros;
- Maior motivação intrínseca;
- Maior número de atitudes positivas para com as disciplinas estudadas, a escola, os professores e os colegas;
- Menos problemas disciplinares, uma vez que ocorrem mais tentativas de resolução dos problemas de conflitos pessoais;
- Aquisição das competências necessárias para trabalhar com os outros;
- Menor tendência para faltar à escola.
O que os estudantes acharam da aprendizagem colaborativa realizada na modalidade a distância?
Buscamos promover a colaboração em todas as disciplinas que lecionamos, tanto no presencial quanto na modalidade a distância. Elaboramos situações de aprendizagem para potencializar a colaboração na turma: conversação em grupo, discussões e debates, dinâmicas de grupo, trabalhos em grupo, coautorias e cocriações, apresentação dos trabalhos dos estudantes para a turma, revisão entre pares, avaliação colaborativa, entre outras situações que visam a criar oportunidades para a tecedura conjunta de saberes por meio de múltiplos olhares, trocas de informações, partilhas de experiências, negociação de sentidos etc.
Sim, as tecnologias digitais em rede possibilitam a conversação online, mas sabemos que uma conversa flui mais naturalmente quando há o olho no olho (KOCK 2001, 2004); sim, sabemos que essas tecnologias possibilitam estar presente sem estar fisicamente no mesmo lugar, mas há limitações para se trabalhar remotamente (MEIRA, 2010, parte 1, parte 2, parte 3). Compreendemos as limitações e os prejuízos, não estamos colocando isso em dúvida. O que precisamos nos questionar é se os estudantes que estão na modalidade a distância (seja por opção, falta de opção ou como única opção, como ocorreu durante a pandemia da COVID-19 [PIMENTEL; ARAUJO, 2020b]) preferem estudar sozinhos ou em rede.
Dando continuidade a uma pesquisa anterior realizada na disciplina “Informática na Educação” do curso de Licenciatura em Pedagogia a Distância (UNIRIO/CEDERJ/UAB) (PIMENTEL, 2018), ao final do segundo semestre de 2017, perguntamos (eu, primeiro autor, e os professores online da disciplina) aos estudantes: “O que você achou da colaboração com os colegas da turma estabelecida nesta disciplina?”. Obtivemos uma enxurrada de respostas positivas (estão sem nome as declarações dos que preferiram ficar em anonimato para garantir a privacidade; e estão revelados os nomes de quem preferiu que a autoria das declarações fosse reconhecida):
Muito bom. Como estudamos em EAD, muitas vezes não temos a oportunidade de ter contato com quem estudamos, e nessa matéria foi diferente, conheci até algumas pessoas, mesmo que por Facebook (Isabella).
Gostei dessa interação; foi um desafio, pois tivemos que nos adequar à realidade dos colegas. Alguns moravam em outra cidade, então tivemos que adaptar e utilizar as tecnologias para nos comunicar e diminuir a distância para realizar as atividades em grupo, e, como ninguém pensa igual, adequar as ideias até chegar a um ponto em comum não foi fácil, mas foi bem satisfatório ao final (Rafaella).
Muito bom. Através da produção dos colegas, você tem a oportunidade de fazer uma reflexão sobre sua própria produção, tendo uma ideia se está no caminho certo, ou não ( ).
Muito prazerosa a relação e a reflexão de significados e opiniões diferente ( ).
Muito válida, acho que cursos a distância devem incentivar interações como as que aconteceram. São contribuições que nos enriquecem bastante ( ).
Acrescentou muito aos meus conhecimentos. Compartilhar ideias e debatê-las foi importante para o meu amadurecimento neste campo de saber ( ).
De grande valor, pois foi possível nos conhecermos melhor e um apoiou o outro, ajudando na conclusão dessa disciplina (Fabrícia).
Muito boa, teve bastante interação. O que eu acho fundamental para se estabelecer uma relação, principalmente porque fazemos esse curso a distância, nos aproximou muito ( ).
A falas dos alunos-respondentes nos fazem refletir sobre o valor da aprendizagem colaborativa na EAD. O relacionamento social no contexto de um curso a distância foi recorrentemente apontado pelos alunos como muito importante, tendo os respondentes mencionado a promoção da socialização, dos relacionamentos, o conhecer os colegas da turma, a aproximação, o apoio mútuo, a união… sentir-se parte de uma turma, estar em grupo, “ajuda na conclusão da disciplina”, ajuda a combater a percepção de estar estudando sozinho (uma das causas da evasão na EAD). As declarações também nos fazem atentar para a importância das emoções no contexto da EAD: prazeroso, interessante, legal, animado… Também reconhecemos, a partir dessas respostas, o valor do tecer em rede os saberes, pois os alunos destacaram a importância da reflexão ampliada pela troca de ideias, pelos diferentes pontos de vista, pelas autorias dos colegas, um tirando a dúvida do outro e também exigindo a negociação de sentidos, dado que “ninguém pensa igual”, tudo levando a um “amadurecimento neste campo de saber”. São tantos os aspectos positivos que, nas palavras de um aluno-respondente, os “cursos a distância devem incentivar interações como as que aconteceram”.
Contudo, nem todos consideraram tudo positivo. Das 117 respostas obtidas, 8 respostas, que estão listadas a seguir, apontaram algum problema ou insatisfação com a aprendizagem colaborativa:
Muito complicado formar um grupo (Rosemary).
Pouca participação ( ).
Não achei que teve tanto contato ( ).
Não houve ( ).
Infelizmente, estou percebendo que os demais estudantes não fazem laços de amizade, solidariedade, companheirismo. É como se fosse uma sobrevivência na selva, onde se salva o mais forte. Tenho sentido que o nível superior nos faz menos sensíveis, menos preocupados com o próximo (Josiane).
Foi boa, mas poderia ter sido melhor se eu tivesse participado mais (Carmem).
Interessante a proposta, mas não tenho tempo ( ).
Em se tratando de um curso a distância, trabalhos em grupo sempre são mais difíceis. Nunca nos reunimos fisicamente, exceto em dias de provas. Moramos longe, cada um tem um horário de trabalho diferente. Então acaba que cada um faz sua parte individualmente e juntamos no fim. Não achei tão dinâmico ( ).
A partir dessas declarações, compreendemos que alguns alunos ficaram um pouco frustrados achando que, na disciplina, ou não houve ou deveria ter havido ainda mais colaboração, participação e contato, para possibilitar fazer mais “laços de amizade, solidariedade, companheirismo”. Essas declarações nos levam a querer melhorar, cada vez mais, a experiência colaborativa na disciplina. Contudo, a realização da aprendizagem colaborativa na modalidade a distância é mais difícil do que na modalidade presencial, precisamos reconhecer: “nunca nos reunimos fisicamente”, “moramos longe”, “cada um tem um horário de trabalho diferente”… Reconhecemos que aprender em rede requer participação, dedicação e “tempo”, e nem todos estão dispostos a realizar esses investimentos na própria formação. Para colaborar é preciso que os envolvidos entrem em acordos, o que exige se encontrar (ainda que remotamente) para conversar e negociar, disputar micropoderes, coordenar a ação de todos os membros do grupo, trabalhar com o outro… e, face às dificuldades para “formar um grupo” e “trabalhar em grupo”, uns adotam a tática de “que cada um faz sua parte individualmente e juntamos no fim”, não havendo, nesse caso, a verdadeira colaboração, a troca e a parceria que desejávamos promover.
O que temos concluído é que promover a colaboração na modalidade a distância é ainda mais importante do que no presencial, em que o convívio no mesmo espaço físico já promove oportunidades para estabelecer relações sociais e lidar com as emoções. Por outro lado, reconhecemos que não é fácil para nós, professores, efetivarmos uma aprendizagem colaborativa em ambas as modalidades, pois isso requer mediação docente ativa para promover mais conversação e interatividade, precisamos coordenar as autorias da turma, e nos exige toda uma perspectiva de avaliação voltada para a promoção da atitude de colaborar e aprender em rede, rompendo com a cultura instituída no sistema educacional hegemônico de realizar exames presenciais apenas para aferir os conhecimentos assimilados.
E você? Considerando suas próprias experiências de formação e suas concepções pedagógicas, considerando as declarações tanto positivas quanto negativas dos estudantes sobre a experiência da aprendizagem colaborativa na modalidade a distância, a que conclusão você chega: para os alunos, é melhor estudar online em rede, colaborativamente, ou é melhor seguir estudando sozinho a distância?
Se você teve fôlego para ler até aqui, é porque considerou úteis as discussões apresentadas. Se você curtiu, então compartilhe esta matéria nas suas redes sociais; vamos viralizar este texto, fazê-lo chegar a outros professores que estão muito além das redes sociais dos próprios autores – afinal, essa também é uma prática da cibercultura que tanto nos inspirou e motivou a escrever as reflexões aqui apresentadas.
Este texto faz parte de uma série sobre EDUCAÇÃO ONLINE:
- Os princípios da Educação Online: para sua aula não ficar massiva nem maçante!
- Ambiências computacionais para dinamizar a sua aula: é hora de ocuparmos ciberespaços!
- Aprendizagem online é em rede, colaborativa: para o aluno não ficar estudando sozinho a distância
- Há conversação em sua aula?
- Atividades autorais online: aprendendo com criatividade
- Cinco equívocos sobre avaliação da aprendizagem
- Princípios da avalição para aprendizagem na educação online
Também recomendamos assistir ao registro da live que realizamos para a SBC:
Live sobre essa matéria
Fonte: https://youtu.be/e2BIMXumrVQ
Apresentação sobre essa matéria
* As ilustrações utilizadas neste texto são de Mônica Lopes, obtidas dos livros Sistemas Colaborativos (PIMENTEL; FUKS, 2011), Do email ao Facebook (CALVÃO; PIMENTEL; FUKS, 2014), Informática na Educação (PIMENTEL; SANTOS; SAMPAIO, 2020), e do site tagarelas.chat.
Referências:
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ARAUJO, Renata; PIMENTEL, Mariano. Educar (em Computação) para a Guerra ou para a Paz? SBC Horizontes, maio 2020.
BARROS, Lígia Alves. Ambiente de Suporte para Aprendizagem Cooperativa Distribuída. Tese (Doutorado em Computação) — COPPE-UFRJ, Rio de Janeiro, 1994.
BORGES, Marcos R. S. Conhecimento coletivo. In: PIMENTEL, M.; FUKS, H. (org.). Sistemas Colaborativos. Rio de Janeiro: Elsevier, 2011, p.186-205.
CAMPOS, Fernanda C. A.; SANTORO, Flávia Maria; BORGES, Marcos R. B.; SANTOS, Neide. Cooperação e Aprendizagem On-line. Rio de Janeiro: DP&A, 2003.
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ELIA, Marcos da Fonseca. A história da Informática na Educação no Brasil: uma narrativa em construção. In: PIMENTEL, Mariano; SAMPAIO, Fábio Ferrentini; SANTOS, Edméa (org.). Informática na Educação. SBC: 2020.
ELLIS, C. A.; GIBBS, S. J.; REIN, G. Groupware: some issues and experiences. Communications of the ACM, v. 34, n. 1, p. 39-58, jan. 1991.
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Como citar este artigo:
PIMENTEL, Mariano; CARVALHO, Felipe da Silva Ponte. Aprendizagem online é em rede, colaborativa: para o aluno não ficar estudando sozinho a distância. SBC Horizontes, jun. 2020. ISSN 2175-9235. Disponível em: <http://horizontes.sbc.org.br/index.php/2020/06/02/aprendizagem-em-rede>. Acesso em: DD mês. AAAA.
Mariano Pimentelé doutor em Informática, professor da UNIRIO, autor dos livros Sistemas Colaborativos (Prêmio Jabuti, 2011), Do email ao Facebook (2014), Metodologia de Informática na Educação (2020) e Informática na Educação (2020). Realiza pesquisas em Sistemas de Informação, Informática na Educação e Sistemas Colaborativos.
Currículo Lattes
Felipe da Silva Ponte de Carvalho é doutor pelo Programa de Pós-Graduação em Educação ProPEd/UERJ, membro do Grupo de Pesquisa Docência e Cibercultura (GPDOC) e do Grupo de Estudos de Gênero e Sexualidade em Interseccionalidades na Educação e na Saúde (GENI).
Currículo Lattes