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Colaboração em Tempos de Pandemia: I Workshop de Colaboração Online

Colaboração em Tempos de Pandemia: I Workshop de Colaboração Online

Esta matéria foi inspirada em uma live da UFBA da série “Computação Viva: Conversas ao Pôr do Sol”, em que as pesquisadoras Adriana Vivacqua (UFRJ), Letícia Machado (UFPA) e Vaninha Vieira (UFBA) comentaram sobre os desafios e oportunidades dos eventos online em tempos de pandemia, apresentando o I Workshop de Colaboração Online, organizado pela Comissão Especial de Sistemas Colaborativos da SBC.


Por Adriana S Vivacqua, Letícia Machado e Vaninha Vieira

A pandemia da COVID-19 e a exigência do distanciamento social afetou a forma como a sociedade se relaciona. No novo cenário de isolamento social, os sistemas colaborativos têm tido papel essencial para viabilizar novas formas de trabalho, conectar pessoas e criar novos espaços de interação e colaboração. A área de pesquisa em sistemas colaborativos também se deparou com vários novos desafios para viabilizar a colaboração online. 

Os eventos acadêmicos, nestes novos tempos, passaram a demandar formas diferentes de organização e participação. Apoiados por sistemas colaborativos, boa parte dos eventos de Computação migraram para a modalidade online (virtual) no Brasil.

Nesse contexto, a comunidade de sistemas colaborativos, por meio de uma comissão de organização composta por membros de 12 universidades brasileiras, propôs o I Workshop de Colaboração Online, que ocorrerá de 5 a 7 de outubro de 2020. O workshop tem por objetivo reunir a comunidade de pesquisadores, alunos de graduação e pós graduação, organizações, instituições de ensino, profissionais e empresas interessadas no tema da Colaboração Online, fortalecendo e motivando a troca de experiências, interdisciplinaridade, criação de redes de colaboração e pesquisa nas áreas de Sistemas Colaborativos e Computação Social.

logo do workshop de colaboração online

O Workshop é constituído de três principais componentes:

  1. Trabalhos: Submissões para pesquisas em andamento, trabalhos finalizados ou propostas de ideias para discussões em poster (relatos de experiências multidisciplinares em projetos ou grupos de pesquisa ou extensão onde a colaboração online é relevante)
  2. Grandes Desafios: propostas de questões de pesquisa que formarão os Grandes Desafios de Pesquisa em Sistemas Colaborativos nos próximos 10 anos (GranDSC 2020-2030).
  3. Design Fiction: Evento de escrita criativa para o imaginário do futuro de sistemas de colaboração em nossa comunidade.

Fica o convite para que todos aproveitem essa oportunidade única para discutir e participar de um workshop voltado para a interação e colaboração online! A seguir, comentamos sobre os desafios, motivações, oportunidades envolvidas na criação de um evento online que foram discutidas durante a live “Colaboração em Congressos Online: E os Eventos Sociais?”

Desafios e Motivações

Em um cenário normal, sem pandemia, provavelmente os eventos acadêmicos e científicos passariam mais lentamente para o modelo online. Discussões sobre mover-se para uma modalidade online já ocorriam, como por exemplo: conferências que haviam crescido em tamanho (e.g., dificuldade de recursos para viabilizar eventos com milhares de pessoas); por questões de sustentabilidade (e.g., emissão de carbono); e por questões de oportunidades de acesso (viabilizar a participação para aqueles sem recursos para viagens), entre outros.

A pandemia infringiu uma necessidade imperiosa, pois sem a modalidade online um evento não poderia ocorrer. Nessa mudança brusca, podemos nos perguntar: o que ganhamos e o que perdemos com os eventos online?

O que ganhamos com um evento online?

Para começar, o evento online fica mais acessível no sentido econômico. Um pesquisador não tem custos de viagem, estadia ou alimentação para apresentar um trabalho e participar do evento. Com a ocorrência de eventos online que implicam em menor custo, há também um incentivo para buscar publicar trabalhos em eventos nacionais e internacionais. Uma redução no preço também pode beneficiar a participação de mais pessoas em eventos financiados por um mesmo orçamento.

A apresentação de conteúdos e disseminação de conhecimento (artigos, resumos etc.) vem sendo atendida pelas conferências com relativo sucesso, tanto nas apresentações ao-vivo (síncronas), quanto nas apresentações gravadas e disponibilizadas (assíncrona). Vídeos são gravados e disponibilizados gratuitamente, aumentando o acesso e as oportunidades de divulgação de um trabalho para uma maior audiência, em contraste com a audiência restrita ao contexto físico de um evento.

Um conteúdo disponibilizado pode ser acessado no tempo que uma pessoa desejar e interagir com o trabalho também considerando esse tempo flexível. Essa disponibilização de conteúdo do evento para acesso também viabiliza novas relações, na medida em que um pesquisador pode entrar em contato com a nova audiência que tem acesso ao conteúdo disponibilizado.

O que perdemos com um evento online?

Em um evento online, perdemos a presença física das pessoas, o “estar junto, estar perto”. Os encontros inesperados, a conversa espontânea – essas questões que ocorrem naturalmente quando há presença e circulação de pessoas em uma localidade física, ocorrem com mais dificuldade quando estamos virtualmente conectados.

O que acontece então com situações informais, como o momento do coffee-break e a “conversa de corredor”? O que ocorre com as situações sociais convencionais, como o “jantar da conferência”? É um desafio replicar o aspecto informal e os encontros fortuitos ou inesperados, como as situações em que as pessoas estão reunidas e interações ocorrem espontaneamente.

Visualizando o evento como constituído, também, de elementos informais, podemos identificar questões e desafios pertinentes. Muitas vezes é apenas em uma conferência que há a chance de entrar em contato com um pesquisador ou autor de um trabalho de maneira menos formal; às vezes a única chance de interagir informalmente é em um jantar ou café, em que se consegue conhecer uma característica diferente de um indivíduo e às vezes criar parcerias e até formar novos laços, como amizades e redes de apoio.

Todas essas questões revelam um ponto importante: qual o objetivo que essas situações sociais formais e informais cumprem? Qual o objetivo do corredor? O que ele traz para um evento acadêmico?

As questões também trazem luz sobre quais questões devemos nos perguntar para solucionar os desafios da modalidade online: como podemos atingir o objetivo de estabelecer encontros e interações informais sem o “corredor” físico e a troca de salas durante as sessões de apresentação? Como viabilizar a transição de alguns objetivos ou características dos eventos sociais integrantes dos eventos acadêmicos, no formato online?

Reconhecendo os desafios dessa tarefa, os eventos online podem focar em buscar soluções para viabilizar as interações informais.

O que podemos fazer? Quais soluções explorar?

No contexto virtual, para simular um encontro é preciso preparar uma videoconferência em uma ferramenta colaborativa online, marcar hora para todos entrarem ao mesmo tempo e ainda motivar e mediar para que ocorra uma comunicação.

A mediação ou facilitação deve ser pensada de forma explícita: quem está projetando ou desenhando uma conferência vai ter que se preocupar também em motivar uma interação entre as pessoas, por exemplo para que uma pessoa não saia da frente do computador e vá embora sem participar, mas que tenha vontade de ficar e interagir informalmente com os outros participantes.

Estratégias incluem a co-criação e realizar atividades em conjunto, como realizar um jogo online, cozinhar uma receita juntos, ou elaborar um documento colaborativo, referente à sessão de apresentação de artigos.

Outras estratégias incluem, por exemplo, tratar de temas da realidade comum, como arte (música, literatura etc.) ou aspectos da intimidade dos participantes, como ser guardião de um animal de estimação, ou ter crianças. Tais elementos, motivados como parte intrínseca do evento social, podem criar uma informalidade ou desinibição entre as pessoas.

Um momento que cativa as pessoas e cria conexão é quando crianças, cachorros ou gatos aparecem em uma chamada de vídeo. Por esses espaços, temáticas da vida comum, é possível conhecer uma intimidade diferente, que por sua vez traz uma informalidade.

Talvez uma estratégia seja reservar na programação do evento um momento para criar conexões, mesmo levando a interação para outras plataformas (como redes sociais), dialogar e dar mais abertura para que as pessoas conversem também sobre assuntos não acadêmicos.

Como pensamos o I Workshop de Colaboração Online?

O tema central do Workshop é a interação. O desejo e o sonho que mobilizou a rede de organização era criar um evento que não apenas transmitisse conteúdo de alguns autores para uma audiência passiva, mas que pudesse envolver, de algum modo, a audiência como também atuante na construção do conhecimento. Afinal, este é um dos princípios do trabalho e aprendizagem colaborativa. Deste modo, algumas ações foram tomadas:

  • Criar sessões interativas, com construção colaborativa de conhecimento e feedback, saindo do modo “apresentar e assistir” papers;
  • Utilizar perguntas geradoras, e formar subgrupos para realizar atividades com objetivos, como é o caso dos Grandes Desafios de Pesquisa em Sistemas Colaborativos;
  • Definir um propósito transversal para o evento, desde o planejamento até o pós-evento: motivar a interação entre as pessoas e a oportunidade de conhecer e formar laços duradouros com outras pessoas.

Também foi considerada a importância e a necessidade de ter um pré e pós-evento: os organizadores devem pensar em atrações que estimulem antes, durante e após o evento. Esse desenho do projeto do evento é relevante: o que o participante vai fazer e como guiá-lo? Uma “âncora” deve ser desenvolvida pelo evento para que o participante não se perca ou disperse.

O foco do planejamento do evento não deve ser na ferramenta tecnológica, mas no desenho da conferência. Por fim, também é importante reconhecer que, dado o novo cenário em que todos estamos, as propostas que surgem têm um caráter experimental e, o sucesso das iniciativas nem sempre é garantido. Há que tentar, experimentar, e compartilhar os resultados.

Qual o futuro das conferências? Com a experiência dos eventos sendo realizados na forma online, talvez possamos esperar uma maior hibridização dos eventos, principalmente no caso de conferências internacionais. Pelos benefícios já mencionados, como redução de custos para participação, os participantes da comunidade científica já defendem que os eventos devem possuir uma parte online.

Entretanto, mesmo em um cenário sem pandemia, não é trivial viabilizar um modelo híbrido de evento: há desafios relevantes a serem considerados, como privacidade das informações geradas no evento, acessibilidade de apresentação dos conteúdos (por exemplo, tradução em Libras) e questões tecnológicas e de infraestrutura.

Nessa matéria, vimos a relevância dos aspectos sociais e informais que os eventos online devem considerar para que as pessoas construam conexões além do trabalho e que conheçam outras pessoas, não como “um artigo”, mas como ser humano. Devemos ver esse cenário como de aprendizado e reinvenção para os eventos e as pessoas envolvidas, como organizadores, participantes e patrocinadores. O momento é então de compreensão, apoio e também de olhar a situação de pandemia como um desafio e oportunidade de inovar.

Revisão e Apontamentos por Deógenes Silva Junior, Elisa Rodrigues e Luiz A. Rodrigues. Ilustração de capa por Mariana Carmin.

Sobre as Autoras

foto de adriana vivacquaAdriana S Vivacqua é Professora Associada do Departamento de Ciência da Computação da UFRJ, Adjunct Chair for Equity da ACM SIGCHI e membro do Steering Committee do ACM GROUP. Com doutorado pelo PESC/COPPE/UFRJ, coordena o grupo de pesquisa ICE (Interação, Colaboração, Ergonomia) na UFRJ, e o Lab Social, que investiga a colaboração (formal ou informal) e a interação com informação. Adora projetar soluções que aproximem pessoas e facilitem sua vida. Carioca, amante dos livros e viajante inveterada, gosta de observar as pessoas e aprender sobre hábitos e culturas em diferentes lugares do mundo.

foto de letícia machadoLeticia S Machado é pós-doutoranda na Universidade Federal do Pará (UFPA) onde trabalha no entendimento do papel da colaboração em times de desenvolvimento de software distribuídos. Atualmente é co-organizadora do SBSC2021, participa como Embaixadora do grupo Parent in Science e Publicity Co-Chair do próximo ACM GROUP2022. É doutora em Ciência da Computação pela PUCRS. Gaúcha, mãe da Laura, é apaixonada por ajudar as pessoas a entregar o seu melhor e atingir seus objetivos. Email: leticia.smachado@gmail.com

foto de Vaninha VieiraVaninha Vieira é Professora Associada e Chefe do Departamento de Ciência da Computação (UFBA). Coordena a CE-Sistemas Colaborativos (SBC). Líder do CEManTIKA, investiga Sistemas Colaborativos e Sensíveis ao Contexto, em Cidades Inteligentes. Doutora pelo CIn/UFPE, com Pós Doc na USC (USA). Formada em Dragon Dreaming, CNV, Constelação Familiar e DEP. Amante de vinhos, artes, música, Biodanza e Tantra Yoga. Sonha desenvolver-se como Ser, fortalecer os grupos, de forma divertida e sustentável, e contribuir para um mundo melhor. [vaninha@ufba.br]

Como citar este artigo:

VIVACQUA,  Adriana S; MACHADO, Letícia; VIEIRA, Vaninha. Colaboração em Tempos de Pandemia: I Workshop de Colaboração Online. SBC Horizontes, setembro 2020. ISSN: 2175-9235. Disponível em: <http://horizontes.sbc.org.br/?p=4294>. Acesso em: DD mês. AAAA.

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